Lei da acessibilidade digital: o seu site está em conformidade?
Imagine um restaurante premiado com uma porta de entrada em vidro transparente. Para a maioria dos clientes, a porta está bem visível e funcional. Mas para um grupo muito significativo de pessoas, essa porta é completamente invisível. Não a conseguem ver de todo. Pior ainda, alguns acabam mesmo por bater nela. Resultado? Esses clientes vão comer a outro lado e aquele restaurante perde negócio.
Esta é a realidade para 87 milhões de pessoas na Europa, entre os quais está mais de um milhão de pessoas residentes em Portugal, que apresentam uma incapacidade definitiva ou temporária.

A chave que pode transformar o seu negócio
Imagine agora que existe uma chave capaz de abrir as portas da internet a essas pessoas. Esta chave existe e chama-se Lei Europeia da Acessibilidade. Todos os estados-membros da União Europeia terão de cumprir o European Accessibility Act, transposto para Portugal através do Decreto-Lei n.º 82/2022, obrigatório a partir de 28 de junho de 2025.
Esta não é apenas uma recomendação simpática sobre inclusão digital. É uma obrigação legal com consequências muito reais para o seu negócio. Na verdade, esta lei tem impacto em empresas, instituições e organizações que tenham qualquer presença digital. Não é uma mudança tímida. Estamos a falar de tornar a web verdadeiramente acessível para todos, independentemente de limitações visuais, motoras, auditivas ou cognitivas.
A questão é simples: está o seu site preparado para esta mudança, ou vai esperar que as autoridades batam à sua porta?
O que muda a partir de 28 de junho de 2025
A Lei determina três pontos fundamentais que afetam diretamente o seu negócio:
Conformidade obrigatória – Todos os sites e aplicações móveis de entidades públicas e empresas privadas devem estar acessíveis segundo normas específicas.
Padrão técnico definido – A acessibilidade é definida com base nas normas WCAG 2.1 AA (Web Content Accessibility Guidelines), o padrão internacional reconhecido.
Fiscalização ativa – Estão previstas auditorias, relatórios e sanções financeiras para quem não cumprir.

Será que o meu negócio está abrangido?
Se tem um site disponível para cidadãos da União Europeia, acabou de passar o primeiro filtro. Agora vamos ao segundo…
A Lei da Acessibilidade Digital aplica-se a organizações (entidades públicas ou privadas, com ou se fins lucrativos, empresas) que disponibilizam produtos ou serviços digitais ao público e que cumpram apenas um destes critérios:
- 10 ou mais funcionários, OU
- Volume de negócios superior a 2 milhões de euros/ano
Se cumpre qualquer um destes requisitos, a lei aplica-se ao seu negócio.
Quem vai fiscalizar o cumprimento?
Não se trata de uma lei “decorativa”. A fiscalização será feita pela autoridade competente do seu sector, seja a ASAE, ANACOM, ERS, Banco de Portugal, entre outras. Todas terão poder legal para aplicar sanções, responder a denúncias de utilizadores e obrigar à adaptação dos serviços digitais.
Importante: qualquer cliente pode fazer uma queixa se o seu site não for acessível, iniciando um processo de fiscalização.
WCAG 2.1 nível AA: o padrão que precisa de conhecer
Agora chegamos ao aspecto técnico que define se está ou não em conformidade. O padrão exigido pela lei são as WCAG (Web Content Accessibility Guidelines) versão 2.1, nível AA – desenvolvidas pelo World Wide Web Consortium (W3C) e reconhecidas internacionalmente.
Traduzindo para linguagem empresarial: existe uma “lista de verificação” específica que o seu site deve cumprir. Esta lista não é subjectiva, é baseada em critérios técnicos mensuráveis.
Os quatro pilares da acessibilidade web
Para tornar o seu site conforme à lei, precisa de garantir que cumpre quatro princípios fundamentais. Pense nestes como os “alicerces” da acessibilidade:
1. Percetível – “Todos conseguem ver/ouvir o conteúdo”
O seu conteúdo deve chegar a todos os utilizadores, independentemente das suas limitações:
- Imagens com descrição – Cada imagem deve ter texto alternativo que a descreva
- Vídeos com legendas – Conteúdo audiovisual acessível a pessoas com limitações auditivas
- Contraste adequado – Texto legível mesmo para quem tem dificuldades visuais
2. Operável – “Todos conseguem usar o site”
Todas as funcionalidades devem estar disponíveis para diferentes formas de navegação:
- Navegação por teclado – Não obrigar ao uso do rato
- Tempo suficiente – Não forçar ações rápidas demais
- Sem conteúdo que cause convulsões – Evitar animações problemáticas
3. Compreensível – “Todos percebem como funciona”
O site deve ser intuitivo e claro:
- Linguagem simples – Textos compreensíveis
- Funcionamento previsível – Botões e links que fazem o que prometem
- Ajuda com erros – Mensagens de erro claras e úteis
4. Robusto – “Funciona em qualquer dispositivo ou software”
O site deve funcionar bem com diferentes tecnologias:
- Compatibilidade – Funcionar em diferentes navegadores e dispositivos
- Código limpo – Estrutura técnica sólida

Exemplos práticos para o seu negócio
Vamos a situações concretas que pode implementar hoje mesmo:
Contraste de cores – Se tem texto cinzento claro sobre fundo branco, provavelmente não cumpre o requisito mínimo de contraste 4.5:1. Teste: consegue ler o texto facilmente num dia muito soalheiro no ecrã do telemóvel?
Navegação por teclado – Experimente navegar no seu site usando apenas a tecla Tab. Consegue aceder a todos os menus e botões? Se não, tem um problema de acessibilidade.

Formulários claros – Os seus formulários indicam claramente quais campos são obrigatórios? As mensagens de erro são específicas? “Erro no campo email” não chega – deve dizer “Introduza um endereço de email válido”.
Descrição de imagens – A foto do vosso produto principal tem uma descrição que permita a alguém “vê-la” através de um leitor de ecrã?

A questão dos plugins “mágicos”
Muitos proprietários de sites descobriram plugins que prometem resolver todos os problemas de acessibilidade com um clique. A realidade é mais complexa:
O que fazem bem:
- Implementação rápida de algumas funcionalidades
- Não requerem conhecimentos técnicos
- Podem melhorar aspetos básicos
As limitações críticas:
- Não substituem boas práticas de desenvolvimento
- Podem afetar a velocidade do site
- A conformidade total requer sempre intervenção manual
- Muitos problemas só são detetados por testes humanos
Conclusão: Os plugins podem ser um primeiro passo, mas não são uma solução completa.
As consequências de não cumprir
Chegamos à parte que ninguém quer ouvir, mas que precisa de conhecer.
Sanções financeiras imediatas
A legislação prevê coimas entre €500 e €25.000, dependendo da gravidade, reincidência e dimensão da empresa. As multas podem ser aplicadas logo após 28 de junho de 2025.
Outras consequências para o negócio
Processos legais – Clientes podem processar por discriminação
Danos reputacionais – Notícias sobre multas por falta de acessibilidade
Perda de contratos públicos – Exclusão automática de concursos públicos
Perda de mercado – Exclusão de mais de 1 milhão de potenciais clientes portugueses

Ferramentas para verificar a conformidade
Não precisa de ser um especialista técnico para começar a avaliar o seu site. Aqui ficam algumas ferramentas que pode usar para fazer um teste básico:
Testes automáticos (gratuitos)
WAVE Web Accessibility Evaluation Tool – Extensão gratuita para navegadores que identifica problemas básicos
Lighthouse – Integrado no Chrome, gera relatórios detalhados com sugestões práticas
Testes manuais essenciais
Navegação por teclado – Teste usando apenas Tab, Enter, Espaço e setas
Leitores de ecrã – NVDA (Windows, gratuito), VoiceOver (Mac, integrado), TalkBack (Android)
A validação definitiva
Testes com utilizadores reais – A única forma de ter certeza absoluta é testar com pessoas que têm limitações reais
O lado positivo da mudança
Esta lei não é apenas uma obrigação, é uma oportunidade de negócio real.
Benefícios imediatos para a empresa
Mercado ampliado – Acesso a mais de 1 milhão de potenciais clientes portugueses
Melhoria geral da experiência – Sites acessíveis são mais fáceis de usar para todos
Vantagem competitiva – Diferenciação face a concorrentes que não cumprem
Melhor SEO – Muitas práticas de acessibilidade melhoram o posicionamento no Google
Exemplos práticos de valor acrescentado
Ao adicionar descrições de cores aos produtos, melhora a experiência de clientes daltónicos. A implementação de navegação por voz pode facilitar compras durante a condução. Formulários mais claros reduzem abandonos de carrinho para todos os utilizadores.
O próximo passo
A Lei da Acessibilidade Digital representa uma mudança fundamental na forma como fazemos negócios online. Não é uma ameaça, é uma evolução natural para um mercado mais inclusivo e, consequentemente, mais lucrativo.
A questão não é se deve adaptar-se, mas quando. E a resposta é: agora. Mesmo que não tenha uma obrigação, deve fazer essa adaptação. Quanto mais cedo começar, melhor preparado estará para aproveitar as oportunidades que esta mudança representa.
Perguntas e respostas essenciais sobre a Lei da Acessibilidade
A lei aplica-se ao meu site, app ou projeto online?
Se a entidade proprietária do site, app ou projeto online tem 10 ou mais funcionários OU volume de negócios superior a 2 milhões de euros/ano, sim. Mesmo empresas menores devem considerar a implementação preventiva.
Quanto tempo tenho para me adaptar?
Até 28 de junho de 2025. Sem prorrogações.
Posso ser multado no primeiro dia?
As autoridades podem aplicar sanções desde o dia 28 de junho. As multas variam entre 500€ e 25.000€.
Um plugin resolve todos os problemas?
Não completamente. Ajuda, mas a conformidade total requer intervenção manual e boas práticas desde o desenvolvimento.
E se alguém fizer queixa do meu site?
As queixas vão para as autoridades competentes (ASAE, ANACOM, etc.), que podem iniciar fiscalizações e aplicar sanções.
A lei aplica-se a sites já existentes?
Sim. Todos os sites devem ser adaptados até ao prazo, independentemente de quando foram criados.
Preciso de uma declaração de acessibilidade?
Sim, a declaração de acessibilidade é obrigatória para as entidades que têm de cumprir a Lei da Acessibilidade Digital.
O que é a declaração de acessibilidade?
A declaração de acessibilidade é uma declaração formal onde a entidade responsável pelo site web ou aplicação móvel informa sobre o estado de conformidade com os requisitos de acessibilidade aplicáveis. Serve como um meio de transparência e prestação de contas perante os utilizadores, especialmente aqueles com deficiência ou incapacidade.
Como sei se estou em conformidade?
Realize auditoria baseada nas WCAG 2.1 nível AA. Use ferramentas automáticas, mas complemente sempre com uma avaliação manual.
Que ferramenta automática me sugerem?
Use a da WAVE Web Accessibility Evaluation Tool.
A acessibilidade vai mudar o design do meu site?
Pode afetar, mas geralmente melhora-o. Sites acessíveis são mais limpos, funcionais e oferecem melhor experiência a todos.
Onde encontro ajuda especializada?
Existem empresas de consultoria especializadas, formações disponíveis e recursos técnicos online gratuitos para implementação. Pode entrar em contacto com a Kaksi Media.